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Sete Vícios,
Sete Virtudes
Celso
Martins
Expresso
Dezembro de 2000
Uma palavra fica, decididamente, ligada
ao ano que finda: Brasil. O centenário do achamento foi o pretexto
para uma diversificada abordagem da cultura brasileira dos dois lados do Atlântico
que não ficou isenta de contradições ideológicas.
Entre as exposições que se puderam ver em Portugal destacaram-se
«Os Indios, Nós» (Museu de Etnologia) e «Olhares
Modernistas» (Museu do Chiado). Uma, ainda em curso, problematiza o
encontro e a distância civilizacional entre as várias culturas
índias e a cultura ocidental que as contaminou; a outra oferecia um
panorama legível da arte modernista brasileira.
A antológica de Lygia Pape em Serralves,
revelou ainda um dos percursos mais relevantes da arte brasileira da segunda
metade do século. Foi também em Serralves que se pôde
ver um dos momentos mais elevados da temporada. «Arte em Berlim no Século
XX» mostrou, através da colecção da Berlinische
Galerie, como a cidade foi um dos palcos da sucessão das vanguardas
do século XX (expressionismo, dadaísmo, construtivismo, etc.),
através das obras de alguns dos seus actores preponderantes (Hannah
Hoch, Dix, Grosz e Gabo, por exemplo).
Outras revisitações históricas
trouxeram a Portugal a menos conhecida faceta de escultor do grande pintor
americano Roy Lichtenstein (CCB) e uma pequena mas significativa exposição
da escultora americana Louise Nevelson (Fundação Arpad Szenes-Vieira
da Silva). Houve ainda a oportunidade de aceder à obra de Andy Warhol
(Serralves) na sua versão mais populista.
Igualmente no âmbito das revisões
históricas, mas a um nível nacional, o ano fica marcado pelas
aguardadas retrospectivas de Joaquim Bravo (Centro de Arte Moderna) e Marcelino
Vespeira (Museu do Chiado), revelando, respectivamente, uma trajectória
feita de íntimos sinais e as grandezas e impasses de uma figura central
do surrealismo português. Também René Bertholo mostrou,
em Serralves, o passado e o presente de uma obra ancorada entre o realismo
e a realidade sonhada, que o artista vem sujeitando a múltiplas resoluções
(pintura, objectos, máquinas de som).
Por Portugal passaram ainda alguns artistas
estrangeiros em plena actividade, que ajudaram a sintonizar o nosso país
com os múltiplos caminhos da contemporaneidade. São os casos
de Gary Hume (Culturgest), Marta Maria Perez Bravo (Gal. Cesar), Lia Menna
Barreto (Gal. Pedro Cera), Tracey Moffatt ou Spencer Tunick (ambos Gal. João
Graça).
Entre nós, 2000 não foi
um ano de grandes revelações. De facto, foram mais as reiterações
da importância de jovens mas já seguras carreiras do que o vislumbre
de novos trajectos. Nesse sentido, cabe destacar duas importantes exposições
de artistas em plena maturidade criativa como Rui Serra e Rui Chafes.
O primeiro apresentou, logo no início
do ano, «Afastamento» (Gal. Arte Periférica), uma exposição
de pintura em cinco partes que absorvia, de modo não hierarquizado,
elementos da história, da literatura, do cinema e do senso comum, num
visual questionamento de relevâncias na observação do
real.
Em Sintra, Rui Chafes apresentou uma grande
operação (Museu Berardo, Palácio e Parque da Pena) onde
confrontava a sua escultura com as suas próprias raízes criativas,
na forma de um labirinto ou paisagem de símbolos e elipses poéticas.
Mas outras apresentações
apontaram caminhos que se vão consolidando no aprofundamento de uma
linguagem pessoal que pode restringir-se a um «medium» ou servir-se
de diferentes recursos. É o caso das exposições feitas
este ano por Baltasar Torres (Gal. Mário Sequeira), Domingos Rego (Gal.
Palmira Suso), Suzanne Themlitz (Gal. Luís Serpa e Casa Fernando Pessoa),
Joana Vasconcelos (Gal. Presença), Miguel Ângelo Rocha, Noé
Sendas/Nuno Cera (Sala do Veado), Cristina Mateus (Gal. Cesar), Catarina Campino
(Gal. Mário Sequeira e Casa Fernando Pessoa) e Filipa César
(WC Container, Casa Fernando Pessoa). Todos eles são artistas que trabalham
na orfandade de um modelo anterior ou de uma receita conjuntural, sem declinarem
um elo com a história ou o diálogo com a cultura de onde emergem.
Para a geração que surgiu durante a década que termina
vai-se desenhando a constatação de que este não é
já o tempo de ofensivas colectivas, por oposição ou ausência
de alternativa, mas o de afirmações individuais, aprofundamentos
inevitavelmente solitários. |
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